A metalografia e a técnica não destrutiva em campo
A metalografia é considerada uma disciplina científica que visa o exame e a determinação da composição e características estruturais dos metais e suas ligas. A visualização dessas características é possível pela devida preparação da superfície e a análise que pode ser feita a vista desarmada, com lupa ou ao microscópio. A metalografia permite uma análise da estrutura com aumentos que podem ser superiores a 1.000.000x, no caso do uso de microscópios eletrônicos e outros modelos mais avançados. Além disso, inclui a análise da estrutura cristalina por técnicas como a difração de raios-X (ASM HANDBOOK- VOLUME 9, 2004).
A divisão em macro e micrografia se dá pela ampliação necessária para o exame e determinação das características dos materiais. A macrografia consiste no exame do aspecto de uma peça ou amostra metálica segundo uma seção plana devidamente polida e atacada à vista desarmada ou com auxílio de uma lupa com aumento máximo de dez vezes (COLPAERT, 2008). Essa análise permite a verificação da homogeneidade do material, da presença de segregações, poros, bolhas, trincas e a existência de vazios e rechupes, por exemplo.
A “micrografia” reúne as técnicas de análise na qual são necessários instrumentos para uma amplificação maior das imagens. Os equipamentos mais utilizados são: o microscópio óptico, microscópio eletrônico de varredura (MEV) e o de transmissão (MET). A microscopia óptica baseia-se na interação da luz visível com a superfície da amostra, permitindo a observação de relevo, cores e tonalidades, por exemplo. Já a microscopia eletrônica vale-se dos fenômenos de interação entre elétrons e os átomos dos materiais analisados para extrair informações sobre a organização topográfica e cristalina do material. A figura 2.1 apresenta alguns aspectos possíveis de serem obtidos a partir dos métodos metalográficos de análise mais corriqueiramente aplicados para os materiais, com base na ampliação alcançada e no poder de resolução. Estrias de fadiga e fases presentes nos aços, como a bainita, são alguns dos aspectos metalográficos que podem ser visualizadas com microscópios eletrônicos de varredura e de transmissão. Uma estrutura martensítica é visualizada, em geral, com aumentos acima de 400x, podendo então ser visualizada com microscópio óptico (BAÏLON et al, 2000).
Além das técnicas apresentadas na figura 2.1, existem outros métodos de análise micrográfica mais modernos proporcionados por modelos mais recentes de microscópios. Nesses microscópios a imagem é criada pela varredura de uma amostra com uma sonda com uma ponta afiada, medindo-se, assim, algum tipo de interação ponta-amostra altamente localizada em função da posição. Esses microscópios se baseiam em diferentes interações sendo os principais modelos: microscópio de varredura por tunelamento, através do qual mede-se uma corrente de tunelamento eletrônico; microscópio de força atômica, que mede as forças de interação entre os átomos da ponta (sonda) e os da microestrutura; e o microscópio óptico de varredura de campo próximo, que mede propriedades ópticas locais através da exploração do efeito de campo próximo. Estes métodos permitem a caracterização de várias propriedades (estruturais, mecânicas, eletrônicas, ópticas, etc.) em qualquer material (metais, semicondutores, biomoléculas, etc.) e em qualquer ambiente (vácuo, líquido ou em condições ambientes) (BHUSHAN, 2004). Esses modelos de microscópios são aplicados praticamente em todas as áreas da ciência e tecnologia que estudam materiais na escala nanométrica.
Figura 2.1 – Diferenças entre métodos de análise metalográfica com base na ampliação e no poder de resolução (BAÏLON et al, 2000)
As técnicas micrográficas exigem preparações das superfícies e espessuras diferentes das amostras, dependendo da técnica a ser utilizada. No caso do MET, por exemplo, como o funcionamento se baseia na transmissão dos elétrons pela amostra, a mesma deve ser fina o suficiente para evitar que estes elétrons colidam com os átomos do material. Dependendo do material e da tensão de aceleração dos elétrons, a espessura da amostra pode chegar a 5000Å. Isso dificulta a preparação das amostras, que podem ser produzidas por réplicas ou por folhas finas do material. Já no caso da microscopia óptica, a preparação é mais simples, mas não menos cuidadosa, já que superfícies polidas ou atacadas incorretamente podem mascarar os resultados. Além disso, as amostras preparadas precisam estar devidamente planificadas para que se possa focalizar a microestrutura.
O uso de réplicas para análise no MET é a maneira mais rápida e simples de se preparar as amostras para determinados materiais com a espessura exigida pelo equipamento. A figura 2.2 resume esquematicamente as técnicas mais comuns para se reproduzir a topografia da superfície por réplicas. Em (A), um “spray” de acetona é aplicado sobre a superfície e, em seguida, uma camada plástica (geralmente, acetato de celulose) é pressionada sobre a mesma. Após o endurecimento da camada, esta é extraída e um filme de C, Cr ou Pt é evaporado sobre a superfície. Em seguida, a camada plástica é dissolvida com acetona e o filme evaporado retém a topografia original, que, então, é levada ao microscópio de transmissão (WILLIANS et al, 2009). Já em (B), uma réplica de carbono é aplicada sobre a superfície e extraída com água destilada.
Figura 2.2 – Métodos (A) e (B) para réplica da superfície para análise no MET (WILLIANS et al, 2009)
O processo de produção das réplicas em campo surgiu a partir dos bons resultados obtidos com o uso de réplicas para análise no MET e se assemelha ao descrito anteriormente na figura 2.2 (A). No entanto, este se diferencia pelo fato de a camada plástica (normalmente, acetato de celulose) ser utilizada diretamente na análise ao microscópio óptico, uma vez que camadas muito finas não são necessárias. Novas técnicas para produção de réplicas têm sido empregadas na indústria como, por exemplo, o uso de aplicadores manuais de uma mistura composta por polímero e agentes de cura. Essa técnica é mais cara, no entanto mais simples, por não exigir pressão sob a película de acetato de celulose e inspetores muito experientes. Dessa forma, o risco de produção de réplicas ruins é minimizado.
O uso de réplicas é o método de metalografia em campo mais corriqueiramente aplicado no meio industrial (Figura 2.3). Nessa técnica, a preparação e observação da superfície são feitas diretamente em campo ou por meio da análise de réplicas preparadas em campo e levadas ao laboratório para a análise convencional em microscópio de bancada. Portanto, pode ser considerada uma extensão da análise em laboratório uma vez que as etapas de lixamento, polimento e ataque são similares, com a diferença de serem realizadas com instrumentos portáteis diretamente no local.
Uma das mais importantes aplicações da metalografia em campo está na análise de falha e avaliação da vida de componentes industriais. Esse ensaio é comumente aplicado em equipamentos que operam a altas temperaturas, principalmente em termoelétricas e usinas metalúrgicas. Nas termoelétricas, rotores de turbinas e lâminas, tubos de vapor e vasos de pressão, por exemplo, são equipamentos que estão submetidos a carregamentos mecânicos e altas temperaturas e, portanto, estão sujeitos a deformações podendo falhar por fluência. Assim, a técnica é aplicada na inspeção e avaliação da vida útil desses materiais submetidos a efeitos que podem resultar em consequências catastróficas. Esses componentes são, normalmente, grandes, caros para substituição e são utilizados para gerar energia continuamente, não podendo, assim, ser desmontados ou seccionados para permitir a obtenção de espécimes metalográficas (BRAMFITTet al, 2004). O uso de réplicas é mais adequado a esses ensaios uma vez que as altas temperaturas limitam o uso de microscópios portáteis digitais, apesar da possibilidade de resfriamento localizado durante o ensaio. O modelo de microscópio portátil usado na elaboração deste trabalho acadêmico não pode ser usado nesses locais devido ao risco de danos ao microprocessador e sensores da câmera do microscópio.
Figura 2.3 – Método de preparação de réplicas na metalografia em campo (BRAMFITT et al, 2004)
Na indústria metalúrgica, a metalografia in situ também possui grande importância, principalmente, quando se trata da inspeção dos equipamentos utilizados nos processos de conformação mecânica. Nos cilindros de laminação, por exemplo, os valores de dureza e a resistência ao desgaste precisam ser altos. Já os aços das bases das cadeiras de laminação precisam absorver as vibrações causadas pelo processo. A inspeção em campo permite uma análise das características microestruturais desses aços, verificando-se, assim, se os tratamentos térmicos dos materiais foram realizados adequadamente pelos fornecedores e se os equipamentos apresentarão o comportamento exigido durante o processo de conformação. Essa inspeção é mais comum nos cilindros de laminação, uma vez que estes são trocados frequentemente durante a operação.
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